quarta-feira, 13 de junho de 2007

O Mito da Democracia Racial

O Mito da Democracia Racial
O racismo é um dos fenômenos sociais que marca profundamente a sociedade brasileira, contribuindo para que as desigualdades sociais aumentem cada vez mais, alargando o fosso entre ricos e pobres e, principalmente, entre negros e não-negros.
A ideologia de que somos um povo mestiço e que a sociedade brasileira é harmônica, esconde uma grande verdade: uma elite branca comanda os postos centrais nos campo político, econômico, cultural, educacional, portanto, estendendo seu domínio a todas às dimensões do social. Os pobres em geral e, negros e índios, em particular, são as grandes vítimas da opressão desta minoria dominante.
O mito da democracia racial esconde o fato de que esta dominação além de ser de classe, é agudizada pela diversidade étnica de nosso povo, em que negros e índios, por suas histórias de escravidão e exclusão, foram colocados à margem desta nação continental. É preciso assumir nossa diversidade étnica e cultural e os conflitos e demandas sociais gerados por esta diversidade.
A visão de mundo que apregoa nossa harmonia beneficia aqueles que nos dominam há séculos, pois reforça a idéia de que somos um povo cordial, avesso a rupturas e transformações. Um povo pacato e passivo.
Precisamos romper com essa visão de mundo, assumindo que somos uma sociedade antidemocrática e desigual, de sem-terra, sem-moradia, sem-comida, sem-educação de qualidade, sem-trabalho, mas que ainda tem esperança e coragem para construir o novo. No entanto, só poderemos construir este novo se tivermos força e coragem para quebrarmos as correntes da opressão, os grilhões que nos impedem de caminhar rumo a uma vida humana digna e completa.
Combater o racismo e os preconceitos de todos tipos representa um passo a frente no caminho de uma sociabilidade diferente. Mas não se combate o racismo sem que reviremos as estruturas sociais que engendram as desigualdades sociais, políticas e econômicas. O racismo reforça as desigualdades e institucionaliza a exclusão de um grupo étnico, minando sua resistência e condição humana. No Brasil, negros e índios são as principais vítimas do racismo. A eles foram negadas sistematicamente as oportunidades de inclusão na sociedade nacional. Eles estão à margem, vivendo na miséria ou indigência.
A situação em que vivem esses povos é degradante e humilhante. Um passado de escravidão e abandono aliado a um presente sem oportunidades reais, cria perspectivas nada animadoras para os negros e índios. Esse quadro precisa ser revisto urgentemente, pois não dá para esperar que as mudanças ocorram a longo prazo para que haja inclusão dos mesmos. É preciso criar políticas publicas agressivas e profundas para que as desigualdades comecem a ser superadas a curto e médio prazo.

A Ética Interpessoal Moderna

A reflexão ética da modernidade, comparada a desenvolvida no pensamento clássico, está aquém de um projeto que compreenda o homem em sua totalidade. O pensamento filosófico moderno ou contemporâneo tem desembocado num quadro de abstração tão grande que, consciente ou inconscientemente, leva a reflexão sobre questões centrais da sociabilidade humana ao plano da a-historicidade. A mutilação da reflexão ética é um dos exemplos mais concretos. Ela deixou de lado a tentativa de compreender a praxis humana e as instituições sociais para deter-se apenas às relações interpessoais, ou seja, à dimensão da subjetividade. Segundo os defensores deste pensamento, a ética deve restringir-se ao plano da interpessoalidade porque para que haja mudanças nos planos individual e coletivo e no nível das instituições sociais basta apenas que os homens sejam tocados em seus corações, com uma espécie de varinha mágica tal e qual nos “contos de fada”.
O problema dessa reflexão é que numa sociedade de classes, como as capitalistas, as relações interpessoais estão cada vez mais restritas ao espaço privado e aos círculos comunitários. As relações entre classes exploradoras e oprimidas são do tipo capital/trabalho. Essas classes se encontram no mercado e as relações não são de face a face: os intermediários (gerentes, administradores, chefes, etc.,), em grande parte, são os mediadores dessas relações.
Como poderá haver relações interpessoais entre classes que estão separadas no espaço, no tempo e na dimensão dos valores e visões de mundo? Espacialmente, a separação entre ricos e pobres é mais do que óbvia (eles não ocupam o mesmo espaço na cidade e conseqüentemente não freqüentam os mesmos lugares); esta separação tem continuidade histórica (os filhos dos pobres de hoje têm grande probabilidade de serem os pobres de amanhã); na esfera dos valores, dominada pelo discurso econômico vulgar, o discurso sobre a desigualdade é utilizado para punir uns e premiar outros (vencem os mais fortes e aptos numa espécie de darwinismo social; a adoção de certos padrões de consumo passa a ser a marca do sucesso ou do fracasso).
O que a ética interpessoal nos diz a todo tempo é que a luta de classes além de não ter sentido – pois vai de encontro a valores universais como o amor, a caridade, a compaixão, justiça – ela não é necessária, pois um dia os que dominam os meios de produção e as forças produtivas terão os seus corações tocados e renunciarão ao direito de exploração e de propriedade que o Estado lhes garante para que todos vivam em harmonia, paz e amor. Também renunciarão ao direito de matar para cumprirem finalmente um dos mandamentos tão pregado entre os homens.
Por seu caráter restrito, a ética interpessoal abandona as condições objetivas da historicidade humana, contribuindo no máximo para uma adequação das condutas e comportamentos ao projeto hegemônico da burguesia. Ela não é uma referência para a construção de uma “contra-hegemonia” à atual hegemonia política, econômica, social, cultural e ideológica, pois se move no terreno da mesma reforçando o caráter de dominação e exclusão. A ética interpessoal não é um processo, ela é um meio, um instrumento a serviço da ideologia dominante.
É preciso reconstruir uma nova ética social, uma eticidade alternativa.

Para Além do Bem e do Mal

Todas as sociedades humanas elaboraram ou elaboram normas e regras que orientam ou condicionam o comportamento. Os esquemas de pensamento e de classificação possibilitam a construção de visões de mundo que situam os indivíduos em um espaço e tempo determinados, onde se desenvolvem relações sociais que caracterizam um agrupamento humano particular. No entanto – talvez esse seja um erro de grande parte dos cientistas sociais que não leva em conta que – essas elaborações coletivas resultam de um longo processo de lutas e conflitos internos.
Por isso, aquilo que compreendemos como sendo o “espírito de um povo” (Volksgeist) é, na maioria das vezes, o resultado de um longo processo de lutas entre grupos e atores sociais que têm projetos e visões particulares do mundo. Os projetos ou idéias vencedores acabam sendo reelaborados e compreendidos como sendo de interesse coletivo ou geral. Assim, a dominação de uma classe ou grupo sobre os demais parece natural já que as visões de mundo dos vencedores transmutam-se em coletivas.
Dessa forma, as idéias do que é certo ou errado, ou seja, do bem e do mal, são recheadas pelo pensamento do grupo ou classe dominante de uma determinada sociedade. Por exemplo, numa sociedade capitalista como a brasileira, na qual a propriedade privada dos meios de produção é a marca principal, a terra que está concentrada nas mãos de poucos não pode ser ocupada por aqueles que precisam para viver e trabalhar. Por isso, parte da população considera erradas ou más as ações de movimentos como o MST, que lutam pela reforma agrária no País.
Para que possamos construir uma moralidade alternativa à burguesa devemos refletir criticamente as respeito das idéias do que é certo e do que é errado, pois são elas que orientam nossas condutas, comportamentos e ações. Precisamos destruir essas idéias e valores que nos submetem à pressão e dominação de uma sociedade excludente, antidemocrática e desigual. Precisamos destruir o bem e o mal que nos cerca e invalida; construamos valores alternativos, fundamentados na democracia e no respeito à diversidade cultural de nosso povo. As relações resultantes desta operação superarão as idéias morais do bem e do mal, pois respeitarão a vontade do povo, que tem o direito de construir democraticamente os caminhos a serem seguidos.

Homens e Bactérias ou Para Além dos Homens-Bactéria

O homem, produtor e produto da cultura, envolvido em teias de relações sociais historicamente construídas, um animal sedento, capaz de transformar o mais inóspito ambiente num lugar possível de existência. As adversidades dos meios físico e social são estímulos para o fazer-se humano. A luta constante pela vida torna-o mais forte e o estimula na busca por novos horizontes. Tentando compreender o mundo elabora interpretações sofisticadas sobre as coisas, possibilitando um situar-se, reencontrando-se consigo mesmo, com os outros homens e com a natureza.
Os milhões de anos que trazemos às costas forjaram essa espécie particular na qual nos tornamos, capaz de pensar o passado e o porvir e, algumas vezes, o presente que nos sufoca ou liberta.
Embora sejamos capazes de criar todo tipo de explicação, seja ela mitológica, mística, religiosa ou científica, em alguns momentos históricos a capacidade do entendimento e da compreensão parece desaparecer ou é sublimado por um falso entendimento, que nos leva a deixar de observar o horizonte, criando um sentimento de incerteza, desesperança e desilusão.
São períodos como esse que colocam em questão os milhões de anos de nossa caminhada por este pequeno planeta. Vemo-nos como vermes e insetos que corroem as entranhas do planeta e de nossos próprios agrupamentos sociais. Bactérias e vírus destruindo o que a natureza e nós mesmos levamos tanto tempo a construir. Eis o que parecemos ser atualmente, criaturas estúpidas que diante daqueles homens que descobriram o fogo e inventaram a roda, não passamos de anões de jardins, de enfeites mal confeccionados de um carnaval fora de época.
Parasitas de nós mesmos, sanguessugas vorazes, carniceiros e mensageiros da destruição: é nisso a que vamos nos reduzir? Temos saída? Ainda é possível alcançarmos o interruptor que religa a luz do fim do túnel? Quem se aventurará nesse caminho? Quem ainda tem uma migalha de esperança? Há ainda alguma coragem para enxergar e construir o novo, o diferente? Vale a pena tentar? Há ainda quem queira entregar-se?

Publicado em Ponto de Mutação – Libelo da Desconstrução, ano I, n. 1, nov./06, p. 02

terça-feira, 12 de junho de 2007

Vale do Jaguaribe: uma história a ser escrita

A região do Vale do Jaguaribe, Estado do Ceará, Brasil, precisa ser melhor tematizada. Foi a partir dela que se deu parte da colonização portuguesa no Ceará, onde a concetração de terras, a pobreza, a miséria e a corrupção imperam definindo os padrões de relações sociais, políticas e econômicas.
É uma região de grandes potencialidades, rica em recursos hídricos e de homens e mulheres a procura de pão e melhores condições de vida.
Dominada por uma elite política arcaica e corrupta, os recursos e bens públicos são utilizados privadamente, aumentando as desigualdades sociais e a miséria que impera nesta região. Há quatro séculos que vem sendo montada um padrão de dominação e exclusão, tornando a vida de milhares de homens e mulheres quase que insuportáveis. É necessário um posicionamento crítico e ousadia daqueles que compreendem que é chegado o momento de combatermos essa situação.
Este espaço propõe-se a discutir as possibilidades e as alternativas de mudança. É o momento de questionarmos os ricos (poderosos e corruptos) e todos aqueles que contribuem direta ou indiretamente para que este estado de coisas continue assim.